segunda-feira, 17 de outubro de 2011

9º Capítulo: Visita incorretamente correta



            Trindom, Trindom, Trindom

Acabei de retomar a consciência em meio ao desespero de alguém tocando a campainha.

Trindom, Trindom, Trindom

“Já vai!” – Gritei, mas duvido que adiante muito, porque ela continua a tocar. Vesti um roupão por cima do pijama e desci correndo. Abri a porta e lá estava ele. O carteiro.

 “Bom dia, desculpa a demora. Eu...” – Olhei para mim mesma de cima para baixo. E ele acompanhou meu olhar. E sorriu. Eu provavelmente estava parecendo um tomate.

“Tudo bem, mocinha. Eu só quero entregar essas cartas.” – Ele as me entregou.

“É... Obrigada.” – Eu lhe disse em meio àquele constrangimento. Ele assentiu e partiu para o vizinho.

Fechei a porta e li os remetentes. O primeiro do meu Gabriel é claro. Abri-a imediatamente como se a outra não existisse. E lá estava àquela linda letra, depois de ele ter me dito que não voltaria a escrever-me.

“Irei direto ao ponto. Eu não quero continuar com essa história ridícula. Você não é minha. Eu não sou seu. Pelo contrario eu já sou de alguém. Eu não preciso de ti, aliás, eu só estava lhe usando. Não vou entrar em detalhes agora. Não lhe interessa. Suas atitudes são as piores e sinceramente, é melhor para você mesma que esse sentimento desapareça rapidamente, assim como surgiu. Se serve de consolo eu nunca lhe amei. Pode odiar-me, isso somente vai ser igualar aos meus sentimentos. Todo esse tempo não significou nada para mim. Somente algo que eu poderia passar com qualquer pessoa. Nada extraordinário. Nunca foi. Obrigado por ser uma distração em meio há tantos séculos. Adorei ‘brincar’ de adivinhar seu futuro. Até nunca mais!”

Não. Não. Não. Ele não pode fazer isso comigo. Ele nunca poderia. Não o meu Gabriel. Dos meus olhos escorriam lagrimas como se nunca fossem parar. Minha vontade era de correr, abraçá-lo e dizer que nós éramos um só. Mas eu sei que isso agora é impossível. Nada mais será capaz de me deter. Eu irei aonde tiver que ir para tê-lo. Não, ele não pode ter feito isso. Agachei-me e não consegui mais levantar, as lágrimas iam corriam pelo meu rosto e tinha fim na minha boca, juntamente com meus gritos desesperadores. Meus pensamentos já estão se despedaçando, assim como meu coração. É como se eu estivesse me jogado de um penhasco. Como se estivesse a ponto de morrer. Meu corpo dói parecendo que eu estou sendo espancada. Minha alma, meu coração, meus sentimentos... Todos eles exatamente como um papel amassado. Como se fosse somente lixos, lixos sem nenhuma importância. Isso não poderia acontecer. Jamais. Eu preciso encontrar minha mãe, talvez ela saiba de alguma pessoa da família que possa ajudar-me.

Corri para a porta, sem forças para ficar em pé. Sai correndo para a rua, sem olhar para nem um lado. Foi quando de repente, uma moto passou e eu não soube nada, somente que tudo escureceu. 

***

Eu estava ali. Sentada em um campo realmente belo. Parecia a Praia de Barra Grande. Sua paisagem estava mais bela do que nunca e eu encarei o mar. Ouvi uma brisa correr, ela era realmente boa. Fechei meus olhos e respirei profundamente, quando ouvi uma grande gargalhada assustadora. Olhei ao meu lado esquerdo e lá estava ele. Alguém que eu não conhecia e mesmo assim, me fazia sentir muito medo. Ele caminhava até a mim e sua voz era intensa e totalmente escandalosa. Por onde ele passava tudo era destruído. O mar, o céu, as plantas e árvores. Tudo transformado em cinza. Ele se aproximava cada vez mais de mim e eu comecei a correr porem era em vão. Como quando uma cobra lhe hipnotiza e não importa quanto você corra, sempre estará indo para o lado contrário. Ele se aproximou de mim. Sua gargalhada cada vez mais próxima até chegar ao ponto em que sua respiração se dispersava junto a minha. Ele passou a mão desde o topo da minha cabeça, até chegar a meu queixo e dizer: “Que pena que Gabriel não conseguiu Júlia”, com gargalhadas ao final. Levei um golpe, realmente grande em minhas costas e cai no chão. Antes que meus olhos pudessem se fechar, percebi alguém correndo em minha direção do lado direito. Ele estava realmente triste e lágrimas escorriam de seu rosto, até que o homem parou suas gargalhadas e disse: “Afaste-se, Gabriel.“

Meus olhos abriram-se e incomodaram-se com a luz. Instintivamente fechei-os e pressionei. Pensei em segundos no que eu tinha visto. Parecia real, mas era apenas um sonho. Gabriel não estava lá e eu estava agradecida de que aquele outro homem, também não estava. Abri meus olhos novamente depois de alguns segundos. Ao meu redor há dezenas de materiais que têm semelhança com hospitalares, provavelmente é onde estou: um hospital. Meu nariz possui um inalador, em meu braço soro. Meu pé está enfaixado. Tecnicamente, tudo para fazer eu me sentir melhor. Como se fosse possível. Como se tudo isso fosse algum tipo de curativo para meu coração. Tentativa em vão. Nada conseguirá curar o ferimento que ele deixou. Instantaneamente tentei recompor meus pensamentos e esse é um dos poucos que poderia lembrar. Pensei imediatamente no que eu fiz naquela hora, Eu não queria pensar nele. Eu não poderia, não posso. Lembrei de abrir minha porta e depois de algo bater em mim bruscamente. Lembrei da mota, do motorista, do carteiro, da carta, do Gabriel. Balancei a cabeça tentando fazer com que meus pensamentos se dissolvessem porem todos os fios do aparelho me impediram.

Ouvi a porta se abrindo e a encarei, esperando ver alguém que realmente fosse importante. Era minha mãe. Por um momento eu achei que poderia ser outra pessoa. Inteligível e Inalcançável.

“Júlia, Júlia meu amor. Eu não acredito. Oh Meu Deus! Você, você está acordada!” - Disse minha mãe em meio a lagrimas e desespero.

“Sim mãe, eu estou. Não chore. Eu só dormi algumas horas, não há porque se preocupar. Desculpe-me eu não sei direito o que acontece. Só percebi agora que tudo está tão...” - Falei desesperadamente até ser interrompida.

“O que? Horas? O que quer dizer com isso? Você sabia que eu passei vindo aqui uma semana, todo dia, para saber se você tinha acordado? Pareceu uma eternidade. Os médicos não tinham muitas esperanças e você não dava sinais de que iria acordar.” - Minha mãe disse mais soando como uma repreensão do que como preocupação.

“É... Desculpa mãe. Eu não imaginei que seria tanto tempo. Parece apenas que, não sei, passaram-se horas.” - Olhei-a e ela me abraçou. Retribui da maneira que eu pude.

Minha mãe passou uma hora inteira conversando sobre como foi à semana e dizendo que o motorista estava bêbado e já ia ser responsabilizado. No fundo, eu sabia que também tive culpa, mas ele tinha uma muito maior. Os médicos me visitaram, comi e eles disseram que eu realmente não parecia nada com como eu estava ontem. Realmente, eu queria estar melhor cada vez melhor. Sempre odiei hospitais e o cheiro me fazia enjoar. E a comida então? Eles disseram que eu faria novos exames e que já iam desenfaixar meu pé, pois era o dia certo, mesmo se eu não acordasse.

***

Dois dias passaram e eu já estava me arrumando para ir pra casa. Coloquei uma roupa qualquer e sai do banheiro e encontrei minha mãe e Rafael. Abracei ambos

“Não acredito que hoje vou sair daqui.” - Disse realmente entusiasmada.

“Hum... Eu tenho uma surpresa!” - Ela disse não muito alegre e Rafael sorriu.
“Acho que vai gostar” - disse Rafael, dando pulinhos.

“O que seria melhor do que sair daqui?” - Disse levantando as sombrancelhas e olhando para os dois.

“Pode entrar.” - Disse ela não tão entusiasmada como Rafael estava. Ela olhou para trás e depois para mim. O que seria?

A porta se abriu e eu pude ver flores e alguém atrás delas. Alguém muito familiar. Alguém que eu conheceria em uma multidão, alguém que eu podia confiar. Alguém como... Como um PAI! Ele abaixou as flores e lá estava ele. Alberto. Meu pai!

            Corri e meus olhos estavam escorrendo grandes lagrimas. Pulei em seu colo e o abracei o mais forte que pude. Eu não poderia ter recebido uma surpresa melhor. Depois de tantos anos, lamentando e contando os dias para que esse momento acontecesse. Depois de ter colocado até na cabeça do meu irmãozinho que isso aconteceria, de ter contado todas as nossas historias a ele, para que quando nosso pai voltasse, nós pudéssemos estar felizes do mesmo modo. Eu não quero soltar. É como se minha eternidade pertencesse a seu colo. Nada é melhor. Nada mais perfeito.

            “Pai, papai. Eu não acredito. É o senhor, o senhor. Mesmo!” - Falei passando a mão em seu rosto. Ele fez o mesmo. Ao responder-me.

            “Oh, meu pequeno bebe. Julia, como você está linda e tão crescida. Eu lhe procurei, soube por um parente que você estava naquela casa e enviei uma carta que provavelmente chegou no dia do acidente.” - A carta, quer dizer, a carta que eu não dei importância. Ele olhou para ver a expressão de meu rosto e então prosseguiu:

            “Deixei um telefone, e Jo...” Ele interrompeu a si mesmo. ”Sua mãe decidiu que era hora de me contatar. Esperei até se recuperar, porque não queria em nenhum momento atrapalhar. E eu estava em... Digo, longe” - Ele disse olhando para o chão e escolhendo as palavras certas.
           
            “Nada importa. Você está aqui agora. E isso é muito importante para mim.” Eu disse caminhando seu rosto a minha face novamente. Ele sorriu.

            “Eu preciso conversar com você, me encontre amanhã às Vinte Horas no Shopping, perto da Praia de Barra Grande” - O nome me fez lembrar o sonho e do... Dele. Ele tirou um papel e uma caneta e escreveu alguns números. “Esse é meu telefone. Qualquer coisa me ligue.” Ele entregou a mim.

            “Mas o senhor não quer ir lá pra ca...” - Minha mãe me interrompeu.

            “Acho que você devia descansar por hoje Júlia.” - Joana disse.
            “Sua mãe tem razão, querida. Vá descansar e amanhã conversaremos sobre o que quiser, está bem?” - Ele me deu um beijo na testa.

            “Tudo bem“ - O abracei novamente. E ele foi em direção a Rafael. Deu-lhe um abraço.

“Esse é meu menino. Amanhã vou te buscar na escola e ai sim nós vamos passar momentos de homem” - Ele piscou para Rafael, Rafael sorriu e balançou a cabeça de representando um sim. Observei meu pai partir. Minha mãe estava com uma expressão vazia desde o carro, até em casa. Após o jantar a única coisa que disse foi:

“Seja bem-vinda novamente. Vá dormir cedo, amanhã será um longo dia.”

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